Causas


#09
 
(PUBLICADO NO DIÁRIO DO SUL)

Prof. Eng.º Nunes da Silva
ESTUDO POUCO CLARO E AMBÍGUO

O convidado do Grupo Pro-Évora para esta sessão foi o Prof. Eng.º Fernando Nunes da Silva, do Instituto Superior Técnico, profundo conhecedor dos problemas de mobilidade e acessibilidade de Évora.

Nunes da Silva começou por duas considerações prévias à sua intervenção: o estudo tem uma grande qualidade técnica, em resposta a uma encomenda política; o diagnóstico constante do estudo deveria ser articulado com uma proposta coerente, com objectivos políticos que deveriam ser discutidos previamente, «e por aí se devia ter começado». Para o orador, «percebe-se a opção política subjacente» ao estudo, que apela a uma «maioria de investimento privado», que, no entanto, «se tem furtado há muito» em Évora. «O problema não é o que está [no estudo], mas o que lá não está», disse Nunes da Silva, rematando que «governar uma população estúpida é fácil, mas uma população esclarecida é difícil», e considerando que «Évora foi exemplar depois do 25 de Abril» em matéria de política urbanística.
Para o Prof. Nunes da Silva há duas «grandes questões» que suscitam a sua apreensão quanto ao estudo: o processo urbanístico e o problema da mobilidade urbana. Quanto ao primeiro, «não está devidamente clarificado e é susceptível de crítica», ao passar da «ilustração» para o projecto, cujo maior protagonista é o capital particular, procurando «portas para contornar a lei através de uma falácia: é apenas uma questão de operacionalização (...) sem mediação política, pública e técnica», mediações estas, no entanto, consagradas na Lei de Bases do Ordenamento do Território – o que representa uma subversão do urbanismo que esta lei consagra. Quanto à mobilidade urbana, a apreensão de Nunes da Silva decorre de ambiguidades que o estudo não esclarece, por exemplo: «o que é transformar rotundas em rotundas urbanas?», quando Évora teve as primeiras do país («afinal não são urbanas?», perguntou); «o que se entende por oferta de estacionamento urbano?», «que privilégios e que condições [serão dadas aos utentes]?», chamando a atenção para «o perigo das concessões a prazo largo».

O Eng.º Nunes da Silva concretizou, então, algumas questões.
Os problemas da mobilidade «são um parente pobre neste estudo». Apesar de o assunto estar muito estudado em Évora, «isso não foi aproveitado». Para o orador, «a escassez do que se diz» no estudo «é a [sua] grande falha», quando «o problema da mobilidade em cidades históricas está hoje na agenda do dia», alertando para o facto de, quando se procura revitalizar a actividade económica por meio da abertura de artérias viárias, se acabar «por matar a solução» («o excesso de tráfego mata a alma da cidade»), «e não há uma palavra sobre isto!», disse.

A segunda questão concreta diz respeito aos residentes: hoje «prescinde-se do automóvel, reduz-se o tráfego em todas as cidades», recorrendo a transportes públicos, bicicletas e aluguer de automóveis, quando nós ainda «estamos na primeira geração do automóvel, queremos dormir com o automóvel debaixo da cama». Sendo previsível que esta situação se mantenha na próxima década, «há que criar alternativas» desde já, «e Évora foi pioneira» nesta matéria.

A terceira «questão concreta» refere-se aos turistas, que «foram os primeiros a aderir aos condicionalismos criados no Centro Histórico de Évora no passado: o turista gosta de andar a pé».

Voltando a considerações gerais, Nunes da Silva afirmou que «não há uma clarificação quanto àquilo que verdadeiramente se pretende, há uma tentativa de agradar a gregos e troianos». Quando «70% da estrutura viária do Centro Histórico tem uma largura inferior a 3,5 metros, é preciso alargá-la para peões ou automóveis?» O estudo nada esclarece sobre este assunto, para o qual «é obrigatório o debate», afirmou.

Reconhecendo que «Évora tem limitações muito claras» quanto à “capacidade de carga”, com um «grande problema de espaço», e atendendo a que o problema dos combustíveis «veio para ficar», o engenheiro perguntou se «queremos um espaço público de fruição da cidade ou de ocupação automóvel». Se queremos as ruas mais habitáveis, então teremos que «reduzir o fluxo [automóvel] e dosear o tráfego». Impõe-se uma «política de selecção» por meio do preço do estacionamento e diferenciando o acesso. Quanto aos parques de estacionamento, foi categórico: «quando o estacionamento é transformado num negócio, torna-se atractivo» e a solução é o «aumento drástico da tarifação», criticando o facto de o estudo preconizar o aumento de estacionamento no Centro Histórico «sem dizer qual é a política de preços» – «não dizer nada é um cheque em branco» e, numa cidade como Évora, «não se pode aprovar um documento destes como um cheque em branco. É estratégico!»

É fundamental, segundo este especialista em mobilidade urbana, integrar os vários modos de transporte, para mais numa cidade como Évora, muito sensível – «quando se faz uma asneira [no urbanismo ou nos transportes], as consequências são imediatas» –, e «isto não foi acautelado no documento».

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